Os ocultos acordes femininos

MÚSICA
Iniciativas tentam mudar a realidade da baixa presença de mulheres no cenário instrumental popular em BH

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Palco. O Abre a Roda teve este ano duas edições no bar Brasil 41

DANIEL BARBOSA

No próximo dia 9, no Necup, das 15h às 18h, acontece a última edição em 2017 do projeto Abre a Roda – Mulheres no Choro, que propõe justamente o que o nome expressa: uma roda de choro composta majoritariamente por mulheres. Criado em abril deste ano e com um currículo que já inclui apresentações em vários bares de Belo Horizonte, o projeto traz em seu bojo uma questão: a cidade possui uma considerável tradição de chorinho e, no que diz respeito à música instrumental, no geral, é um reconhecido celeiro de talentos, mas chama atenção a gritante escassez de mulheres nesse circuito musical.

“Não existem mulheres instrumentistas na cidade? Mulher não gosta de tocar?”, foram alguns dos questionamentos que a atriz e cantora Michelle Barreto, criadora do Abre a Roda, se fez após constatar essa ausência feminina quase que completa nas rodas de choro da cidade. “Em abril deste ano teve a comemoração pelo centenário do Pixinguinha, e várias casas que normalmente recebem rodas de choro abriram as portas simultaneamente. Frequentando essas rodas notei que não havia mulheres tocando. Depois, conversando com meu amigo (violonista) Rodrigo Torino, perguntei se ele tinha conhecimento de mulheres instrumentistas na cidade. Ele fez uma lista das que conhecia, e eu comecei a entrar em contato, propondo nos juntarmos todas para tocar choro”, conta Michelle.

O Abre a Roda, que hoje é composto por 18 instrumentistas mulheres que se revezam nas rodas (pois nem sempre todas podem estar presentes) e duas técnicas de som, revela que, sim, elas existem, apenas não encontram espaço para tocar. “Se uma mulher chega a uma roda de choro com um instrumento na mão, vão perguntar se ela está carregando para o namorado. Criamos o Abre a Roda para dar visibilidade para as mulheres instrumentista e para criar um contraponto, porque é uma roda de mulheres, mas aberta aos homens, queremos que eles toquem com a gente, porque é como a gente gostaria que eles agissem”, diz Michelle.

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Ela acredita que a considerável ausência de mulheres em rodas de choro ou formações instrumentais de outros gêneros da música popular se deve a questões históricas e, claro, à cultura machista. “A gente tem discutido muito sobre isso. A Maria Bragança (saxofonista, veterana da cena instrumental mineira) considera que seja uma questão histórica. Assim como o acesso das mulheres à educação, ao voto e a outros direitos veio mais tarde, o acesso à música também. A Maria diz que, quando você toca um instrumento, você sente prazer, e a mulher sentir prazer sempre foi tabu, uma coisa difícil de ser aceita. A mulher poder ter esse prazer de tocar, antigamente, era um pouco apavorante. A gente tem tentado mudar isso”, diz.

A escassez de mulheres é notada não apenas nas rodas de choro, mas no ambiente da música instrumental popular (porque, nas orquestras, no campo da música erudita, há um maior equilíbrio entre homens e mulheres) como um todo. Em eventos como o Savassi Jazz Festival e o Novos Talentos do Jazz ou em premiações como o BDMG Instrumental, também observa-se uma clara desproporção entre os talentos femininos e os masculinos.

Conforme aponta Beth Santos, coordenadora do BDMG Instrumental, ao longo de suas 17 edições anuais, apenas duas mulheres foram premiadas – Daniela Rennó, que ficou entre os quatro vencedores em 2009, e Juliana Perdigão, que ganhou como melhor instrumentista em 2006. Na edição de 2017, considerando os 12 finalistas e as bandas que os acompanhavam, ou seja, num universo de aproximadamente 50 ou 60 músicos, apenas duas mulheres figuraram – a percussionista Nathália Mitre e a baixista Camila Rocha.

“Estou sempre convidando a mulherada, não só para concorrer, mas também para compor o júri, porque a representação é muito pequena mesmo”, diz Beth, que, no entanto, vê uma certa mudança no cenário. Também coordenadora do Jovem Instrumentista BDMG, voltado para músicos em formação, ela aponta que, nesse projeto, a presença feminina é maior. “Acho que isso aponta para uma mudança de panorama, as meninas mais novas estão investindo mais nesse ambiente da música instrumental. Depois que a Escola de Música da UFMG incluiu no currículo a música popular, isso também ajudou a abrir mais, tem mais mulheres participando dessa movimentação fora do ambiente erudito. E tem esses exemplos, como as meninas do choro, o que é muito bom”, saúda.

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O   TEMPO

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