Maria Schneider apresenta experiência emocional em SP

ROGER MARZOCHI - Agência Estado
Uma forte experiência emocional. Esta é a melhor forma de definir a música de Maria Schneider, independentemente do rótulo "jazz". "Eu acho que as pessoas têm receio do jazz por pensarem ser algo que não podem entender. E muitos me dizem até: ''eu não gosto de jazz, mas gostei disso''", conta a compositora. E o motivo dessa sua capacidade em chegar ao coração do público, mesmo aos que fazem cara feia ao rótulo, é o caráter contemplativo e intenso de sua música. "O mundo vive uma ansiedade muito grande, numa necessidade de tocar tudo muito rápido, com muitas notas. E as pessoas que estão impregnadas dessa música do século 20 estão agora gerando a música do século 21. Maria é ponderada e generosa e esse amalgama é a verdade do artista", define o trombonista e compositor Vittor Santos.
Desde segunda-feira, a norte-americana, que se tornou um expoente da música instrumental das big bands a partir da década de 90, ensaia no auditório da Escola de Música do Estado de São Paulo - Tom Jobim (Emesp), no Brooklin, com 19 músicos brasileiros, com os quais apresentará, no sábado, no Auditório Ibirapuera, um concerto com oito composições que representam, ao mesmo tempo, uma inovação na forma de expressão artística e, também, de sobrevivência.
Seus últimos discos não são encontrados nas melhores lojas do ramo, mas em seu web site, que vende não apenas o disco, mas todo o conceito que envolve o processo criativo. Com sua música, ela fez história ao vencer, em 2005, o primeiro Grammy com "Concert in the Garden", álbum vendido apenas pela web. E, em 2008, repetiu a dose com a música "Cerulean Skies" - do seu último disco "Sky Blue", que foi considera a melhor composição instrumental.
Anteontem à noite, a reportagem acompanhou parte do ensaio, aberto aos estudantes da Emesp, dentro da programação da I Mostra Instrumental da escola, a partir da música "Aires de Lando", com belíssimo solo de Luca Raele. "Mais suave", dizia Maria aos trombonistas, entre eles o mestre Vittor Santos, enquanto se movia em um misto de dança e regência, estendendo os braços, sentindo a música, enquanto os cabelos longos, dourados, se mesclavam à luminosidade dos instrumentos de sopro. "É ótimo trabalhar com ela, perceber como ela pensa a música. Ela é uma grande referência no mundo das big bands", diz o trombonista Paulo Malheiros. "Rola uma energia muito boa. A gente arrepia... parece que estamos na mesma sintonia", completa o saxofonista Vinicius Dorin.
Após uma série de detalhes, mais relacionados ao sentimento da música que à técnica, o ensaio dá espaço para um show propriamente dito, onde Maria chega reger os cerca de 40 expectadores ao convidá-los a marcar o ritmo com palmas. "Os músicos estão olhando para uma informação técnica (a partitura). O que busco é transmitir a eles a alma da música, a personalidade da música", afirma Maria. Essa música, explica, surgiu após viajar ao Peru e ouvir lando, ritmo local. E, como muito do que criou, a intenção primeira não era necessariamente expressar o que viveu. "Eu nunca digo ''vou escrever uma peça sobre minha infância''. Nunca é a intenção. Eu começo a escrever algo e, de repente, percebo que a música está conectada à lembrança. É como dar uma nova forma a um sentimento, que pode ser transferido a quem ouve."
"Coming About", música do disco de mesmo nome, a leva, por exemplo, diretamente ao barco em que velejava na infância. "Uma das coisas mais legais com essa música, em um concerto, várias vezes, é que eu me sinto nesse barco. Não sei se levo alguém para lá, mas eu vou. Não tenho como dizer como isso acontece, ocorre involuntariamente." A música não está no set list, mas a big band fará o público voar em "Hang Gliding", quando Maria voou pela primeira vez de asa delta, no Rio.
A mesma música foi apresentada no festival de Ouro Preto, em 2007. E, no festival de jazz de Detroit (EUA), a mesma música a fez sentir quão importante é a sua arte. "Estava assinando os CDs após o show e chegou uma mulher em uma cadeira de rodas, e disse, em lágrimas: ''estou nessa cadeira de rodas há tanto tempo que nem sei dizer e, hoje, eu me senti como se estivesse voando''. Depois dela, um homem me disse que há 18 meses foi diagnosticado um câncer de próstata incurável e que ele teria 18 meses de vida. Ele estava no momento em que supostamente morreria. E me disse que a música o fez esquecer do medo. Isso me fez muito feliz, por fazer isso por alguém." Talvez seja por causa de sua contagiante energia e extrema simplicidade que, dizem, ela é herdeira da arte de Duke Ellington e Stan Kenton.

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