ARY BARROSO

Ary Evangelista Barroso
* 07/11/1903 Ubá, MG, Brasil.

† 09/02/1964 Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Instrumentista, compositor, maestro
 
"Quem nasceu para padre já traz do berço a coroa. Parece que a música impregnou-se em mim, desde o dia que dei o primeiro berro. E nunca mais me largou".
O pai de Ary Barroso era advogado e político e, ao mesmo tempo, boêmio, violonista e cantor. Porém, a convivência entre os dois foi curta; quanto tinha apenas oito anos, Ary ficou órfão de pai e mãe, sendo adotado pela avó materna e por uma tia viúva
Essa tia, pianista, foi decisiva para sua vida musical, responsável “pelas piores horas da minha vida" – como diria Ary mais tarde, referindo-se ao fato de que sua tia o obrigava a estudar piano, teoria e solfejo várias horas por dia, segundo a mais rígida disciplina dos conservatórios.

Numa entrevista de 1961, Ary contou que: "Ela me castigava com vara de marmelo. Eu odiava aquilo. Nunca imaginei que aquele martírio acabasse me dando os meios para ganhar a vida".
Métodos à parte, a paixão pela música se enraizou em Ary que, aos 12 anos, acompanhava filmes mudos num cinema de sua cidade, revezando o piano com a própria tia.
INSTRUMENTISTA

“Tenho orgulho do tempo em que fui pianista de cinema. Os filmes eram mudos e ninguém podia suportá-los sem acompanhamento musical: valsas suaves e românticas no momento dos beijos e dos idílios, marchas heróicas nas cenas de batalhas... Tenho orgulho, porque, para comer, podia ter furtado, tomado dinheiro emprestado para não pagar, ou feito bandalheiras parecidas. Ao contrário disso, transformei o piano em minha enxada. E valeu a pena”.
O prestígio de Ary como compositor ofuscou o seu lado de pianista, que poucos conhecem. No entanto, Ary desenvolveu um estilo pianístico bastante inovador para a época, mais contido, econômico, pontual, em contraste com a escola erudita transportada para o piano popular, que dava preferência ao piano cheio e arpejado. Em seu estilo, podem-se enxergar algumas das características que Tom Jobim viria a adotar posteriormente.
Na contracapa de “Encontro com Ary”, o compositor declarou: "Quero deixar às gerações futuras alguma coisa que o tempo não destrua. (...) Então, fazendo rodar este disco, poderão ouvir minha voz e meu piano. Não é um piano virtuose, nem uma voz de ouro. É o piano simples que me ajudou a descobrir harmonias. É a voz metálica dos microfones e dos bate-papos
COMPOSITOR

“O Ary Barroso é um amigo da alma, um homem que eu ouvi na minha infância, ouço a minha vida inteira. Não precisa falar de Ary Barroso. Um homem que o Tom Jobim assumiu como pai musical não tem nada que falar. ‘Aquarela do Brasil’ diz por si só! (Guinga)
Ary Barroso foi, acima de tudo, compositor. E, apesar de percorrer uma grande variedade de ritmos, como marchas carnavalescas, valsas, toadas, canções, batuques e cateretês – e até estilos estrangeiros como fox-trots e tangos – Ary se orgulhava de ser compositor de sambas, em suas diversas modalidades.
Diferentemente de quase todos os sambistas de sua geração, Ary Barroso tinha formação musical, lia música com facilidade, escrevia na pauta, criava arranjos e orquestrações, e compunha ao piano e não no violão.
Grande parte de suas composições tem uma sofisticação harmônica e melódica incomum nos sambas do seu tempo. Melodias elaboradas, contendo temas contrastantes, variedades rítmicas, modulações (mudanças de tonalidade) e o uso de acordes substitutos são algumas das características de suas obras mais conhecidas.
Ary criou pouquíssimas obras puramente instrumentais. No entanto, justamente pela riqueza harmônica e melódica de suas canções, muitas delas acabaram sendo adotadas como standards brasileiros, recebendo um sem-número de interpretações instrumentais.
Foi, ainda, um dos compositores de uma geração anterior mais gravados por músicos da bossa nova, como João Gilberto.
Sua primeira composição gravada foi o samba “Vou à Penha”, na voz de Mário Reis em 1928; a última, o samba-canção “Em noite de luar”, em parceria com Vinícius de Moraes, é de 1962.
Da simplicidade absoluta das primeiras composições (uma delas não tinha mais que 3 acordes), Ary realizou um surpreendente salto de qualidade. No período entre 1931 e 1934, lançaria “No Rancho fundo”, “Maria”, “Caco velho”, e “Na batucada da vida”, entre outras que transformariam a história do samba, e que já demonstravam toda a sua destreza de compositor.
Embora defensor ferrenho das tradições musicais brasileiras contra a invasão de estilos estrangeiros impulsionada pela indústria do disco, Ary foi um inovador: “Faceira” era considerada pelo próprio Ary como primeiro samba com telecoteco – com isso queria dizer que era um samba de outro tipo, nem derivado do maxixe, nem samba de morro, mas uma variedade urbana mais leve e sincopada; “Aquarela do Brasil” é o primeiro samba-exaltação de que se tem notícia.
“Aquarela do Brasil” é um capítulo à parte.
Composta praticamente de uma só vez, num dia de chuva com a família em casa, no ano de 1939, chamava a atenção, primeiro, pela temática nacionalista, afastando-se das histórias de amor e boemia que ocupavam quase todas as letras da época – exceção feita a Noel Rosa, seu contemporâneo. Mas foi a riqueza musical da composição que a levou para o mundo.
“Creio que já compus mais de trezentas canções. Talvez cheguem a quatrocentas. Algumas são executadas em todas as partes do mundo. Outras, em lugar nenhum. Várias fracassaram redondamente e eu mesmo só me lembro delas com um grande esforço. Por exemplo: ‘Aquarela de Minas Gerais’. E as músicas carnavalescas ‘Chiribiribi’ e ‘Querequequé’, completamente ignoradas pelo público. Em alguns casos, o fracasso resulta de pouco trabalho para divulgá-las. Há sucessos que nascem da insistência. Veja o caso de ‘Aquarela do Brasil’. Foi gravada, inicialmente, por Aurora Miranda, excelente cantora e então um nome popular. Mas ninguém tomou conhecimento. Depois, quando os grã-finos levaram à cena ‘Joujoux e Balagandans’, [de Henrique Pongetti] no Teatro Municipal, a mesma música, sem tirar nem por, foi, na interpretação de Cândido Botelho, um verdadeiro estouro. Exatamente igual é o caso de ‘Risque’, também gravado por Aurora Miranda e inteiramente ignorado. Dircinha Batista gravou e foi um chuá.”
A gravação definitiva de “Aquarela do Brasil” foi feita em 18 de agosto de 1939 por Francisco Alves, com a célebre introdução de Radamés Gnattali que, a partir daí, ficou definitivamente incorporada à uma obra. A percussão era comandada por Luciano Perrone, que foi quem deu a Radamés a idéia de criar a introdução ritmada. Totalmente fora dos padrões da época, a composição de Ary com arranjo de Radamés ocupava os dois lados de um 78 rpm, e durava quase 6 minutos.
Por conta de “Aquarela do Brasil” e “Na Baixa do Sapateiro”, Ary Barroso tornou-se o primeiro compositor popular brasileiro a alcançar sucesso e trabalhar nos Estados Unidos.
“Na Baixa do Sapateiro”, também de 1939, foi seu segundo maior sucesso. Incluída por Walt Disney na trilha sonora do desenho animado “Você já foi à Bahia?”, deu início à carreira de Ary como compositor de cinema, convidado a criar o tema do filme “Brasil”.
Escreve, ainda, a canção-tema do filme “Três Garotas de Azul”, e 18 composições para um filme chamado “O Trono das Amazonas”, que nunca chegou a ser lançado devido à morte do produtor. Vale lembrar que as trilhas de Ary Barroso eram feitas de canções, e não de peças orquestrais.
Mas o cinema foi apenas uma extensão de outra atividade à qual se dedicava antes dos 30 anos de idade: o teatro de revista, para o qual escreveu mais de 60 trilhas e, em alguns casos, o argumento e o roteiro.
Compositor incansável, desde 1935 dedicou-se também a criar jingles publicitários, sendo o primeiro para o chope da Brahma.
São mais de 250 as suas composições conhecidas. Algumas das mais representativas (em número de gravações) como parte do repertório instrumental são:
•“Aquarela do Brasil”

•“Camisa amarela”

•“Canta, Maria”

•“Chorando”

•“É luxo só”

•“Eu nasci no morro”

•“Faceira”

•“Foi ela”

•“Folha morta”

•“Isso aqui o que é”

•“Maria”

•“Morena boca de ouro”

•“Na Baixa do Sapateiro”

•“Na batucada da vida”

•“No rancho fundo”

•“No tabuleiro da baiana”

•“Os quindins de iaiá”

•“Pra machucar meu coração”

•“Rio de Janeiro”

•"Risque”

CARREIRA

A carreira musical de Ary Barroso, iniciou-se ao piano, em 1923, numa orquestra que tocava na sala de espera do Teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro.
A partir daí, ainda na década de 1920, foi pianista de algumas outras orquestras, como a do maestro Napoleão Tavares,
com a qual conheceu a Bahia – uma das influências mais decisivas em sua vida.
“Outro erro em que muitos incidem é o de suporem que descobri musicalmente a Bahia. Não é verdade. Eu é que me descobri na Bahia. Os seus ritmos, seus candomblés, seus capoeiras, sua gente, em geral, foram para mim uma revelação. Fiquei de tal modo impressionado que o jeito foi exteriorizar essa admiração através da música. Isso data de uns trinta anos. Mas, antes de mim, Pixinguinha já havia composto dois ou três sambas sobre a ‘boa terra’. Um deles dizia: ‘Oi, eu queria ir uma vez à Bahia...’. Depois, veio o Dorival Caymmi, cantando as praias, os coqueiros, os pescadores, a lagoa de Itapuã...”
Em duas dessas orquestras, a American-jass, do Maestro José Rodrigues e, depois, a Jass-band Sul-Americana, de Romeu Silva, Ary Barroso travou contato com arranjos mais sofisticados e com a liberdade harmônica que é um dos atributos do jazz.
Ary, que era um homem de acumular – nunca abandonar – experiências, teria na vida de músico e regente de orquestra uma atividade da vida inteira.
A década de 1930 é marcada pelo grande sucesso popular como compositor, desde marchinhas de carnaval até sua grande obra, “Aquarela do Brasil”. Em paralelo, dedicou-se de corpo e alma ao teatro musicado, ou teatro de revista, numa relação que duraria 30 anos. Entrou ainda para o rádio, como pianista. E passou a dirigir a orquestra de um importante teatro do Rio de Janeiro.
“O grande momento de minha carreira, o que me proporcionou a maior emoção de minha vida, foi quando Walt Disney incluiu em seus desenhos animados as minhas músicas ‘Aquarela do Brasil’ (sob o título de ‘Brazil’) e ‘Na Baixa do Sapateiro’ (sob o título de ‘Bahia’) e ‘Os Quindins de Iaiá’.
A década de 1940 foi marcada pela carreira internacional, pela inclusão de suas músicas nos filmes de Walt Disney, e pelo sucesso estrondoso de “Aquarela do Brasil”, “Na Baixa do Sapateiro” e, em menor escala, “Os Quindins de Iaiá”. Sua paixão pela Bahia transformada em música encontrou em Carmen Miranda a principal divulgadora. Mas, se as gravações vocais tinham apelo popular, os músicos encontraram nos sambas e sambas-canções de Ary um tipo de composição capaz de sustentar execuções instrumentais ricas e criativas.
Foi nessa época, também, que a personalidade combativa de Ary fez com que criasse a União Brasileira de Compositores (UBC) e a Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores da Música (SBACEM), com a finalidade era proteger os direitos autorais.
Na década de 1950, realizou um sonho de vida ao criar, em 1953, a Orquestra de Ritmos Brasileiros. Com ela excursionou por vários países da América Latina, e deixou gravados discos raros, nunca lançados aqui, que somente agora começam a ser (re)descobertos.
Devido à doença, uma cirrose hepática, Ary diminuiu muito a intensidade de sua carreira musical, tanto de compositor quanto de músico e chefe de orquestra. Abandonou o teatro no início da década de 1960, quando o teatro de revista também se encontrava em franca decadência; e praticamente deixou de compor e se apresentar.
Quando se descreve a carreira de Ary Barroso, mesmo que num contexto musical, é relevante lembrar, também, que foi um dos nomes mais importantes do rádio, desde a década de 1930, atuando como locutor esportivo, humorista, redator, produtor, repórter e mestre-de-cerimônias. Ary Barroso foi o inventor dos programas de calouros, e por seus programas passaram artistas que viriam a se tornar grandes nomes da música brasileira, como Elza Soares, Luiz Gonzaga e Lúcio Alves.
Quando surgiu a televisão, na década de 1950, Ary foi também um de seus grandes astros.
Polêmico, opinativo, tornou-se Deputado Estadual pelo Rio de Janeiro e foi um dos criadores da lei que deu origem ao Estádio do Maracanã.
PREFERENCIAS
Radialista e jornalista, Ary Barroso deixou registradas muitas de suas opiniões – e Ary era uma pessoa de opiniões firmes. Dentre elas, suas preferências musicais:
Para ele, os dez maiores sambas foram:
•“Gosto que me enrosco” (Sinhô)
•“Amélia” (Ataulfo Alves e Mário Lago)
•“Feitiço da Vila” (Noel Rosa e Vadico)
•“Favela” (Hekel Tavares e Joracy Camargo)
•“Iaiá de Ioiô” (Luiz Peixoto e Henrique Vogeler)
•“Nervos de aço” (Lupicinio Rodrigues)
•“Agora é cinza” (Bide e Marçal)
•“Se você jurar” (Nilton Bastos, Ismael Silva e Chico Alves)
•“A fonte secou” (Monsueto)
•“Deixa esta mulher chorar” (Brancura)
Considerava Ataulfo Alves o maior compositor brasileiro.
Mas, apesar de conservador, foi um dos primeiros a adotar a bossa nova e a ser adotado por ela. Afinal, Ary se considerava um sambista que enxergava o samba em todas as suas nuances, e bossa nova também era samba.
“Esse Tom Jobim é um gênio.”
Outra de suas admirações era o Maestro Eleazar de Carvalho.
”Foi meu companheiro em orquestra de dança, tocava tuba: nos intervalos harmonizava trechos de melodias que lhe eram dadas num curso do Instituto. Mais tarde aparece como Maestro dirigente da Orquestra Sinfônica. Eu fiquei muito alegre e todos os seus triunfos são mais do que merecidos. Porque ele, de origem pobre e modesta, é hoje uma glória da regência brasileira.”
DISCOGRAFIA

São muitas as gravações em que se pode ouvir o piano de Ary, porém a maioria está em 78 rpm obscuros cuja única fonte de audição é o Instituto Moreira Sales.
Ary lançou apenas três LPs de carreira:
•"Encontro com Ary” (Copacabana, LP 10’ / 1955), é um bate-papo musical em que Ary toca, canta e fala de sua carreira
• "Ary Caymmi - Dorival Barroso" (Odeon, LP/1958) reúne Caymmi e Ary Barroso; Caymmi canta canções de Ary, que executa ao piano canções de Caymmi
•“Meu Brasil Brasileiro” (Odeon, LP/1958) traz Ary Barroso ao piano, acompanhado de uma grande orquestra, executando suas composições
Do Site  Músicos do Brasil | Uma Eciclopédia
              http://musicosdobrasil.com.br/
 

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