TEMPO EM QUE PICKUP ERA VITROLA


Conheça Seu Osvaldo, identificado como o primeiro DJ brasileiro, e ouça seu som no Baile Esplendor

Lauro Lisboa Garcia

Foi Claudia Assef quem deu o toque no antológico livro Todo DJ Já Sambou: Seu Osvaldo Pereira foi identificado como o primeiro DJ brasileiro. Atuou de 1958 a 1968, período mais efervescente da música popular no Brasil. Parou porque cansou, "ficou monótono".
A revelação de Claudia, porém, tirou o sossego (no bom sentido) de Seu Osvaldo. Técnico de som aposentado, ele passou a ser solicitado não só por jornais e emissoras de rádio e televisão para contar sua história (teve até um encontro com o britânico Fatboy Slim), mas por equipes de festa para discotecar em bailes. Aos 74 anos (completa 75 em dezembro) ele volta às pickups por duas horas neste sábado na terceira edição do Baile Esplendor, na Livraria da Esquina. Além dele e Pamela Leme no som mecânico, uma banda faz o show Uma Noite no Cassino da Urca, idealizado por Romulo Fróes e Rodrigo Campos.

Encontrar Seu Osvaldo, para Clau Assef - que além de jornalista também é DJ e mantém o blog http://tododjjasambou.virgula.uol.com.br/ - "foi um golpe de sorte". "Fazendo apuração dos DJs dos anos 70, fui parar no Gran Master Ney, que me falou de Osvaldo, seu tio avô."

Seu Osvaldo é do tempo em que DJ era chamado de discotecário, não tinha status de popstar, e pickup era vitrola. O repertório básico de seus sets é de "nostalgia", como diz, para dançar aos pares. No caso dele, sucessos do período em que animava os grandes bailes e ganhou o apelido de Maestro Mecânico. Gostava de tocar gravações de big bands e geralmente começava os bailes trabalhando por trás da cortina. "As pessoas achavam que tinha uma orquestra tocando. Quando a cortina se abria e viam que era som de disco, ficavam surpresas", lembra. Daí o nome de seu projeto Orquestra Invisível, que hoje tem mais dois maestros mecânicos: seus filhos Tadeu e Dinho, que, como o pai, seguem a mesma linha de repertório e vestem trajes "sport chic". Essa é também uma exigência para o público: quem aparecer de tênis e boné vai ser barrado no baile.

Os mais de 200 discos de vinil que Osvaldo tocava nos bailes estão todos bem conservados em engradados de plástico, com esses usados para transportar garrafas de cerveja, num quarto em que mantém também um bom e potente equipamento de som. Na mesma casa onde mora desde antes de se casar, entre outros aparelhos únicos e originais, está ali funcionando perfeitamente - como ele fez questão de demonstrar - o primeiro amplificador valvulado que montou quando trabalhava numa loja de consertos de rádio e montagem de aparelhos de alta fidelidade na Santa Ifigênia, a região paulistana dos aficionados por som.

Osvaldo fazia os bailes com um único toca-discos, sem usar fone de ouvido, acessório que atualmente faz parte de seu equipamento. "De alguns discos eu tocava várias faixas do mesmo lado, então quando uma ia terminando, abaixava um pouco o som e já colocava a agulha na outra." O público que frequenta as "baladas" hoje já cresceu habituado às mixagens - e faz parte da boa atuação do DJ tornar as passagens entre um tema e outro imperceptíveis. Nos bailes dos anos 60 era o contrário. Tinha te ter um intervalo entre uma música e outra "para os pares trocarem de damas". "Os casais de namorados ficavam de mãos dadas, esperando entrar a próxima música", lembra o veterano.

Além de primeiro DJ (ou discotecário), Seu Osvaldo também deve ter sido pioneiro no Brasil em usar crossover e mixer, que ele mesmo inventou. "Eu só tinha um toca-discos. Pedi outro emprestado para o meu patrão e fiz o teste com o mixer num baile. Ninguém gostou, porque o pessoal estava acostumado com os intervalos entre uma música e outra. Não usei mais", lembra.

Seu set é composto de muita música dos anos 60. "São imortais, o pessoal sempre dança. Depois vou incluindo muita coisa de samba-rock atual." O repertório de estilo samba-rock não se limita à mistura dos dois gêneros feita no Brasil, mas inclui muita música instrumental, easy listening dançante de orquestras americanas e latinas, rhythm"n"blues. Na coleção de discos de vinil da casa na Vila Guilherme há vários títulos de Perez Prado, Glenn Miller, Bert Kaempfert, Ray Coniff, Burt Bacharach, Jackson 5, Ray Charles, Elza Soares, Elis Regina e Jair Rodrigues, Eduardo Araújo, Helena da Lima.

Como muitas outras histórias de gente que se embrenhou pela música, Osvaldo começou a fazer festas em casa, por brincadeira. "Aconteceu quase naturalmente. Desde criança sempre gostei muito de disco. Antes ouvia muita música no rádio. Depois meu irmão mais velho comprou um toca-discos que você podia ligar no rádio. Mas só existia discos de 78 rotações, não existia o LP ainda. E a gente começou a fazer muita festa junina nessa casa. Não existia essa avenida ainda", lembra.

Trabalhando na loja, Osvaldo teve contato com a abastada clientela de seu patrão, "que falava cinco línguas". "Construí um pequeno amplificador e comecei a fazer bailes na redondeza. Numa festa de aniversário me chamaram para animar um piquenique em Itapevi. No piquenique recebi um convite para tocar no Clube 220, no Edifício Martinelli, onde iniciei."

Depois de um bom tempo foram aparecer outros discotecários, lembra ele. Com a demanda para tocar, Osvaldo chegou a fazer parte de uma equipe de bailes junto com sua mulher, que cuidava da bilheteria, mas logo desistiu, "porque na hora de dividir o dinheiro com os outros sempre dava problema". Ele nunca foi muito de dançar, mas acha importante que um DJ tenha uma ginga, para estimular a pista. "Gosto muito de bolero, então quando me dava vontade de dançar, colocava uma música, deixava os meninos cuidando do som e descia para a pista."

Como diz Tony Hits, outro especialista em baile nostalgia, no livro de Claudia Assef, DJ é "o cara técnico, que faz performance, virada, scratch". Discotecário como ele e Seu Osvaldo é o que se preocupa mais com a qualidade do repertório, sem malabarismos. Mas Osvaldo também agora está, aos poucos, aprendendo a fazer scratch, comprou até um mixer Numark igual ao de um DJ que deu uns toques para ele de como criar efeitos e está gostando da brincadeira.F

Copilado de MÚSICA do Caderno 2 do ETADAO.COM
www.estadao.com.br

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